sábado, 29 de setembro de 2012

E por tudo, perdoa-me...pai

Passou muito tempo, muito tempo desde que tu foste embora para sempre e sei que não escrevi para ti uma única linha, que nunca existiu lugar para ti em meus diários, desculpa-me! Eu sempre enterro aquilo que me faz mal, que ainda me fere! E de alguma forma, entre mim e ti nunca ficou muito por dizer, e quaisquer que sejam as minhas palavras, eu sempre serei uma desilusão. Eu sou uma perfeita desilusão, pai!
Tudo o que sonhaste para mim no primeiro momento em que me tiveste em teus braços, transformou-se em cinzas! A tua "pequena Branca de Neve" cresceu e tornou-se na "Rainha Branca de Neve" por cada grama de loucura que o meu corpo aguentou.
E estou a escrever-te hoje por isso...para te dizer que sei que me amaste acima de todas as minhas rebeldias mas que esperavas mais...muito mais de mim, e que foi nesse mais que eu falhei! Mas que quero que saibas que nunca quis que assim fosse...queria ter sido perfeita como tu sonhaste, lamento não ter conseguido! E que todos estes anos te admirei, à minha maneira. Tu eras forte, persistente, àgil, astuto, corajoso, digno...quase perfeito, e apesar de todos os teus erros no amor e na vida, sempre te idolatrei...talvez porque no fundo, sempre quis ser como tu! Viajar sozinha pelo mundo, longe das pessoas, longe de tudo.
Sempre foste a prova de que os homens sentem amor...a forma como tu a tratavas quando estavas, como se ela fosse o teu Deus na terra! Como tu a olhavas, como nunca gritaste, como nunca desejaste mais ninguém...Tudo isso chega para teres o meu respeito e o meu perdão! Perdoo-te mas de qualquer forma, a tua distância ateou fogo para a nossa família! Sei que lamentaste até ao teu último segundo pai...e eu lamento, lamento de verdade toda a minha degradação a que foste obrigado a assistir. E todas as minhas escolhas, eu lamento, por saber que elas te magoaram mais do que me magoaram a mim mesma.
Quero pedir-te também perdão pelos meus pés amarem o Hip Hop e nunca o Ballet, pelas vezes que brinquei na rua enquanto tu, do outro lado do mundo, me julgavas a ler William Faulkner.
Perdoa-me por ser um alvo fácil de magoar, por ter voado tantas vezes em céus quebrados. Pelo silêncio, nenhum gesto ou palavra! Pelo jogo perigoso que escolhi jogar e pelas regras que eu quebrei, pelos erros que cometi e pelas coisas que fiz à minha maneira.
Perdoa-me por tudo o que fiz e tudo que não fiz, por não lamentar coisas, que sei, que devia lamentar. Mas que não lamento porque pai, a verdade é que a luz que encontrei dentro de cada erro meu, ligava todas as peças espalhadas do meu mundo. E fazia sentido ou sentido algum, mas tudo o que queria que brilhasse, brilhava!
Lamento sim, ter-me estilhaçado nessas peças que nunca se colocaram no lugar, e, então perdoa-me por ter perdido contra mim mesma, por ter-me perdido!
Lamento ter estado longe de casa todas as noites e ter crescido depressa demais. Por ter vivido, visto e feito mais do que devia, muito mais!
Peço-te perdão pelas substâncias que queimaram a minha infância, que me incendiaram e transformaram em lixo. Pela minha alma anestesiada e meu corpo pouco acordado, por ter cortado a carne dilacerada de mim mesma, pelos pactos de sangue a que estarei ligada toda a minha vida e de que me orgulho! Por todos os demónios que vivem em mim, por ter deixado de sentir medo e pelo iceberg em que me transformei. Por só respeitar céu e mar e por não gostar do mundo, desse mundo que tu tanto amaste!
Eu sei pai, eu sei que a droga varreu-me para longe e me fez esquecer quem sou, e que a única dor que permaneceu foram as minhas derrotas, mas eu fui feliz pai e por isso, eu sei que não existe perdão algum! Porque eu sei, que as coisas de que me arrependo , tu não podes esquecer...e as que eu não lamento...tu não podes perdoar! 


Um comentário:

mitra_g_dance disse...

"Eu sempre enterro aquilo que me faz mal, que ainda me fere!"
"Perdoa-me por ser um alvo fácil de magoar, por ter voado tantas vezes em céus quebrados. Pelo silêncio, nenhum gesto ou palavra! Pelo jogo perigoso que escolhi jogar e pelas regras que eu quebrei, pelos erros que cometi e pelas coisas que fiz à minha maneira.(...)Pela minha alma anestesiada e meu corpo pouco acordado, por ter cortado a carne dilacerada de mim mesma, pelos pactos de sangue a que estarei ligada toda a minha vida e de que me orgulho!(...)Porque eu sei, que as coisas de que me arrependo , tu não podes esquecer...e as que eu não lamento...tu não podes perdoar! "

AMEIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIII